quinta-feira, 27 de junho de 2013

DesapEGO

Quando falo do sonambulismo que move o mundo, me refiro à impressão que tenho de que a maioria das pessoas parece levar a vida sem estar acordada, apenas seguindo convenções e crenças sem consciência, presa a um certo tipo de entorpecimento marcado pelo ego. Por isso é que enxergo este nosso mundo, tal como tem sido, como um mundo-berçário, já que predominantemente feito por quem sequer “acordou”, logo, por quem não tem nem condição para um amadurecimento genuíno. De fato, acho raríssimo encontrar gente madura e sensata por aqui. Há algumas pessoas, umas mais, outras menos, mas, ainda assim, são como agulha no palheiro. Eu mesma não me considero madura, tenho minhas vicissitudes, porém ao menos estranho a ordem estabelecida das coisas, questiono e preservo a perspectiva crítica, o que já me parece um bom começo.
Amadurecimento é uma questão de livre arbítrio. Ele não vem naturalmente com a idade, você precisa desejá-lo muito e buscá-lo.  E, como não há amadurecimento verdadeiro sem desapego, o sofrimento faz parte desse processo, sendo muito útil para nos livrarmos do ego. O amadurecimento depende necessariamente do ego, pois só é alcançado com a sua superação, e todo esse processo é sofrível. Aqui, acho que vale a pena a citação de Osho:
“E este é o ego: o reflexo, aquilo que os outros pensam. (...) O verdadeiro pode ser conhecido somente através do falso, portanto, o ego é uma necessidade. Temos que passar por ele. Ela [a consciência] é uma disciplina. O verdadeiro pode ser conhecido somente através da ilusão. Você não pode conhecer a verdade diretamente. Primeiro você tem que conhecer aquilo que não é verdadeiro. Primeiro você tem que encontrar o falso. Através desse encontro, você se torna capaz de conhecer a verdade. Se você conhece o falso como falso, a verdade nascerá em você”. (Em: Além das fronteiras da mente).
Afinal, qual é a sua máscara? Quais são as suas máscaras? Embora sem sentir, todos temos máscaras na medida em que não nos descolamos de nossa imagem, do ego, a principal barreira à emancipação humana. Enquanto se tem uma imagem de si mesmo, nunca se terá uma relação com o outro; as relações que você acha que tem são fantasiosas. A individualidade sustenta as máscaras. No processo de amadurecimento, em que o ego é necessário – e, por corolário, a alteridade –, acredito que passar pelas mais diversas experiências seja contributivo, ajuda na superação da fase egocêntrica. Isso me lembra vários exemplos, como a estória de um engenheiro brasileiro que resolveu trabalhar por alguns anos como operário de uma fábrica para sentir na pele a vida proletária. Isso me lembra, também, um ensaio de Montaigne em que ele diz:
“Um único estilo de vida não é viver, é ser. Não nos devemos apegar assim tão fortemente às nossas tendências e temperamento. O nosso talento principal é sabermos aplicar-nos a práticas diversas. O estar vinculado, e necessariamente obrigado, a um único estilo de vida não é viver, é ser. As almas mais belas são as que têm mais variedade e flexibilidade. Se me fosse possível, não haveria nenhuma forma, por melhor que fosse, na qual eu quisesse fixar de sorte que não fosse capaz de dela me apartar. A vida é um movimento desigual, irregular e multiforme. Não é ser amigo (e muito menos senhor de si mesmo) deixar-se conduzir por si e estar preso às próprias inclinações que não possa desviar-se delas nem torcê-las – isso é ser escravo de si próprio. Digo-o neste momento por não me poder facilmente desembaraçar da importunidade da minha alma, que consiste em ela normalmente não saber se ocupar senão do que absorve, nem se aplicar senão por inteiro e de forma tensa. Por mais trivial que seja o assunto que se lhe dê, ela logo o aumenta e estica a ponto de ter de se empenhar nele com todas as forças. A sua ociosidade me é, por esta causa, uma ocupação penosa e prejudicial à saúde. A maior parte dos espíritos precisa de matéria de fora para se desentorpecer e exercitar; o meu dela antes precisa para se acalmar e repousar – “os vícios do ócio devem se dissipar com o trabalho (Sêneca) – pois o seu principal e mais laborioso estudo é de si mesmo”. (Em: Ensaios - De Três Espécies de Convivência).
Portanto, dá para compreender que estereótipos, preconceitos, discriminações, paranoias e tudo o mais sejam desdobramentos do necessário ego, mas, se quisermos realmente ser maduros, devemos ter muita coragem e disposição para nos colocarmos no lugar do outro, ou melhor, “viver o outro” – a partir daí, damos um sentido diferente ao "outro". Além disso, muita meditação, reflexão, vontade de crescer e de se entender no mundo, lembrando que, como disse Krishnamurti, não é sinal de saúde estar bem ajustado a uma sociedade profundamente doente. Conhece-te a ti mesmo.
 

terça-feira, 25 de junho de 2013

Por uma reforma política democraticamente realizada

Os programas de governo, para serem executados, precisam se pautar em leis respectivas estabelecendo direitos, deveres, obrigações, enfim, regulando as relações jurídicas decorrentes da ação do Poder Executivo. Sem lei prévia, o Executivo não pode atuar. Então, no presidencialismo de coalizão, o partido que está na Presidência da República sem ter maioria no Congresso tem que fazer alianças com outros partidos que estão no Poder Legislativo só para poder governar. Simples assim. Então, digamos: a presidenta Dilma quer executar o PAC e, para isso, precisa que as leis que tratam desse programa sejam aprovadas no Legislativo. Só que a maioria dos parlamentares faz charminho, dizendo que não vai aprovar as leis a menos que ganhe algo em troca. E aí? Como fica?
 
Trago essa situação para mostrar a sinuca de bico que a atual organização do sistema político brasileiro coloca para quem quer governar para o povo. O modelo induz à corrupção, não só por esse aspecto, como também pelo financiamento privado de campanha entre outras questões. Está claríssimo que a reforma política é necessária, todo mundo enxerga isso.
 
A proposta da convocação de um plebiscito e a discussão, via Constituinte, do saneamento das estruturas políticas e parlamentares significa uma injeção de democracia na veia do Estado brasileiro, um aprofundamento da manifestação democrática. É o inverso do autoritarismo. Para os que creem na democracia, não há dúvida: é a nossa chance para que a tão necessitada reforma política aconteça. Enquanto isso, só quem estará contra essa proposta é a oposição conservadora e retrógrada, que, antidemocrática, não quer saber de ouvir o que o povo quer porque não quer governar para o povo, só quer parasitar no poder submetendo a política a seus próprios interesses.
Aproveitando o embalo, compartilho a seguir texto sobre a "ilusão de ótica" que a grande mídia promove na opinião pública brasileira.
 
Já que está na "moda" falar de corrupção, saibam que o TSE realizou um levantamento sobre a corrupção no Brasil, e adivinha quem ficou em primeiro lugar? Bom, fica a dica de sempre: antes de criticar A, B ou C, procure se informar.
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 Aqui está a lista completa dos corruptos. Só para lembrar, a fonte dessas informações é a Folha (tucana) de S. Paulo.

CORRUPÇÃO E GESTÃO PÚBLICA:

Ranking das cassações no TSE, por partido:
DEM: 69 - 20,4%
PMDB: 66 - 19,5%
PSDB: 58 - 17,1%
PP: 32 - 10,1%
PTB: 24 - 7,1%
PDT: 23 - 6,8%
PR: 17 - 5,0%
PPS: 14 - 4,1%
PT: 10 - 2,9%

No ranking do STF:
PMDB - 8
DEM - 6
PSDB - 6
PR - 5
PP - 4
PTB - 4
PDT - 3
PT - 2
PPS - 1
PV - 1
PMN - 1

Fonte: Folha de SP
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 Se você se espanta em não ver o PT nas primeiras colocações, mesmo com a maciça divulgação de "escândalos" de corrupção, há algo de muito errado na mídia em que você consome notícias e informações.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Dicas básicas

A vergonhosa ignorância da classe média brasileira tem sido exposta em toda a sua extensão através de publicações, há algum tempo, nas redes sociais e, agora, nas ruas também. Acho que as dicas abaixo podem ajudar a nos poupar um pouco de 8 micos reiterados. Não custa tentar, vamos lá:
 
1- Não compartilhe o vídeo dos atores da Globo contra Belo Monte. Esse vídeo de 2011 está cheio de informações falsas. Inclusive alguns atores que gravaram o vídeo se arrependeram depois de descobrir que o que eles disseram não era bem assim.

2- Não diga que foram gastos 30 bilhões em estádios. Na verdade, foram gastos 7 bilhões, que é coisa pra caramba. Desses 7 bilhões, grande parte é emprestado pelo governo federal, mas a maior fatia será paga pela iniciativa privada. Os outros 23 bilhões foram investimentos em infraestrutura, transporte e aeroportos.
 
3- Nunca peça para o governo gastar com saúde o mesmo que se gastou com estádio de futebol. Nos 7 anos de preparação para a Copa, foram gastos aproximadamente 7 bilhões com estádios. Neste mesmo período, foram gastos mais de 500 bilhões com saúde. Então, se você fizer isso, na prática, você está pedindo para reduzir consideravelmente os gastos com saúde. Gastos com saúde nunca são demais. Então, cuidado para não pedir a coisa errada.

4- Não peça a um presidente da república para garantir que algum político seja preso. Isso é papel do poder judiciário. O manifesto deve ser endereçado a este poder.
 
5- Não peça a um presidente da república para impedir a votação de uma lei ou PEC. Isso é prerrogativa do Congresso. O manifesto deve ser endereçado aos parlamentares.
 
6- Não peça a um presidente da república para cassar o mandato de algum deputado ou senador. Isso é papel das casas legislativas. Está escrito no artigo 55 da Constituição Federal.
 
7- Nunca peça para fechar o Congresso e acabar com os partidos. O último presidente que fez isso foi um Marechal. Tal ato aconteceu em 1968 e foi nada menos do que o temido AI-5 da ditadura.
 
8- Não compartilhe aquelas informações falsas sobre o auxílio reclusão. O auxílio reclusão é um benefício pago à família do detento que contribuiu com o INSS, logo ele está recebendo um valor pelo qual já pagou anteriormente. O detento deve ser punido, não sua família.

Por Sidney Braga

domingo, 23 de junho de 2013

EmMissão

Desde crío me conducía en el soñar
Toda era imposición
Desde niño controlaban lo que iba a pensar
Mataban la ilusión
Lo que no mata me fortalece hoy
Ser combatienteMe fortalece hoy por hoy
Por hoy…
Y nunca quise ser igual
Nunca me latió ser del rebaño
Pensar tan diferente hoy
Hoy me tiene vivo combatiente
Soy combatiente
Nadie me va a parar
Soy combatiente
Nada me va a parar
Soy combatiente
Sobreviviente yo
Lo que no me mató
Me fortaleció 

Somos en serie fabricados

Como unos clones programados
Siempre imponiendo que pensar
Que joder, que amar, que pensar, que pisotear

Su misión es lo que nos mata
La imposición
lo que nos va a matar
Mejor es respetar
Al próximo amar
Y ser un combatiente
Soy combatiente
Nadie me va a parar

Soy combatiente nada me va a parar 
(Maná)


Em missão de emitir, psicografaram: não se apresse em acreditar em nada, mesmo se estiver escrito nas escrituras sagradas. Não se apresse em acreditar em nada só porque um professor famoso que disse. Não acredite em nada apenas porque a maioria concordou que é verdade. Não acredite em mim. Você deveria testar qualquer coisa que as pessoas dizem através de sua própria experiência antes de aceitar ou rejeitar algo.


sábado, 22 de junho de 2013

A verdadeira trama global que freia a democratização do Brasil

1 - Globo diz que Renan Calheiros, Presidente do Senado, não presta, mas tem ele como sócio. Renan é dono de rádio em Alagoas.

1.1 - que retransmite o sinal da Rádio CBN, que é da Globo. Globo não reclamou de Renan quando ele foi Ministro da Justiça de FHC.

2 - Globo diz que Sarney não presta, mas tem ele como sócio. Sarney é dono de TV no Maranhão que retransmite o sinal da TV Globo.


3 - Globo diz que Collor não presta, mas tem ele como sócio. Collor é dono de TV em Alagoas que retransmite o sinal da TV Globo.

4 - Globo diz que Henrique Alves, Presidente da Câmara, não presta, mas tem ele como sócio. Henrique Alves é dono da TV Cabugi

4.1 - do Rio Grande do Norte, que retransmite o sinal da TV Globo.

5 - A Globo individualiza para despolitizar. Quando rolar a Regulamentação das Mídias, eles se unirão para votar contra.

Dos 513 deputados, o PT só tem 86; dos 81 senadores, o PT só tem 12. O único partido da base aliada que o PT pode contar é com o PCdoB.

O tamanho da bancada de empresários no Congresso é de 45%.

Como o PT poderá aprovar uma Lei de Médios se o Presidente da Câmara, Henrique Alves do PMDB, é sócio da Globo, e o Presidente do Senado, Renan Calheiros do PMDB, também é sócio da Globo?

O führer tupiniquim nosso de cada dia

Nos últimos dias, com o tema do totalitarismo vindo à tona, imagens de um líder carismático manipulando uma enorme massa popular em defesa de ideias ignóbeis em nome de uma suposta moralidade da nação foram relembradas como repetição de um filme já visto. Talvez sob essa influência, hoje pela manhã resolvi enfrentar cenas de terror nos mesmos moldes, só que diretamente da vida real brasileira, ao sintonizar minha televisão em um canal aberto que transmitia um ato comandado por um pastor de igreja evangélica, o Silas Malafaia.

Diante de um mar de gente, de religiosa aquela sessão só tinha a "fachada", pois, na verdade, tratava-se de um comício. As palavras do escandaloso pastor eram de ódio contra tudo o que fosse progressista – ou, segundo ele, "esquerdopata". Aos gritos, igualzinho a Hitler, pregava diante de milhares de zumbis que levantavam os braços e repetiam em coro uníssono: "líder, líder, líder, líder...". Não, não estou inventando. Aconteceu em 15 de junho de 2013. Acontece todos os dias.

À medida que eu permanecia firme aguentando assistir àquele show de horror, o caráter agressivo do discurso do pastor me inoculava violência, uma intensa energia negativa que acabou prejudicando as próximas horas do meu dia, enquanto não saía da minha cabeça a imagem do protótipo de führer tupiniquim destilando todo o seu veneno verbal hipnotizante sobre a plateia contra a felicidade de seres humanos, sejam eles homossexuais, mulheres, negros ou qualquer um, já que ele também abordou várias questões que se refletem na vida de toda a população, atacando até a necessidade de regulamentação dos artigos constitucionais sobre o setor da comunicação social no Brasil – questão que defendo com unhas e dentes e que considero a mais importante a ser resolvida para o bem da democracia brasileira, como expus aqui. É lógico que o marco regulatório das comunicações – que existe em praticamente todos os países democráticos do mundo, entre os quais os Estados Unidos – não interessa a um führer, pois ele quer continuar enriquecendo através da manipulação de um gigantesco contingente de pessoas em um país de dimensões continentais, o que é extremamente facilitado pela divulgação de suas pregações por todos os dias da semana em quase todos os canais abertos da televisão. Entretanto, o que o pastor não diz é que a prestação do serviço de transmissão de produtos audiovisuais só é permitida mediante concessões públicas (está na Constituição) e, sendo o Estado laico, é inaceitável a veiculação desse tipo de conteúdo. Ela só acontece porque sobrevive uma bizarra interpretação jurídica de que, enquanto o direito à comunicação social não é regulamentado, não se poderia inibir a liberdade de a televisão mostrar o que lhe convém, isto é, o que mais lhe enche os bolsos independentemente do lixo exibido. 

Se a Constituição for regulamentada nesse tocante, adeus, igrejas: fiquem em paz e que o senhor vos acompanhe, mas a exibição na TV aberta das pregações religiosas não será mais tolerada definitivamente, abrindo-se espaço para os conteúdos constitucional e democraticamente previstos, que são artísticos, culturais e educativos. E, acima de tudo, abriria espaço para mais liberdade, mais paz e muito mais amor.


OBS.: coerentemente, o pastor também fez campanha contra a aprovação da PEC 37. Claro: a montagem de um cenário propício à concretização de um golpe branco pelo Poder Judiciário contra um governo de esquerda democraticamente eleito parece interessantíssima aos setores conservadores.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

3 fases do gigante

Os casos de ex-militantes de esquerda que viraram conservadores típicos com o avançar da idade sempre me pareceram amostras do que faz a fraqueza pessoal face à força da vida real que segue sua marcha como se estivesse invariavelmente alheia às nossas vontades de mudá-la democraticamente a partir da imaginação de mundos (melhores) possíveis. Observando esses exemplos, para mim, de fraqueza humana, sempre procurei reforçar meu voto de resistir contra as insanidades deste mundo, não importa o baque que eu sofra. No entanto, ainda que permaneça resistindo convictamente, confesso que, de ontem para hoje, finalmente consegui entender aqueles a quem atribuo a referida fragilidade ao ver a história se repetindo diante de mim como um ciclo vicioso ao qual estamos presos em um fluxo contra o qual nadar é cansativo e bastante sofrível.

O movimento pela redução das tarifas do transporte público urbano começou como uma daquelas brechas históricas em que a esperança lhe toca mais agudamente e você vislumbra a oportunidade de realização de sonhos derivados de um sonho básico e tão próprio das esquerdas: o despertar em massa das consciências. Mas, agora, apenas me restam a tristeza, o consolo e o orgulho de que fiz minha parte, lutei até onde deu. Com certo otimismo, espero que algum efeito colateral positivo disso tudo se sobressaia politicamente daqui para frente.
Após a noite de ontem, quando o pessoal representante de partidos políticos e de movimentos sociais e sindicais dos trabalhadores foi escorraçado das manifestações em todo o Brasil, enxergo a seguir 3 fases de todo esse movimento até agora:

1ª) O Movimento Passe Livre – MPL nasce no Sul do Brasil reivindicando o passe livre nos meios de transporte urbano e logo se espalha por outras capitais brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro. Com engajamento político e pauta de esquerda, seus integrantes são estudantes politizados, cada qual com sua preferência partidária ou não, e se orientam por uma agenda anticapitalista. Com o último aumento no preço das passagens de ônibus, em junho de 2013, convoca protestos pelas redes sociais que, como fagulha lançada à palha seca, se alastraram rapidamente por todo o país.

2ª) Os protestos ganham corpo e agregam, além do pessoal politicamente engajado, uma galera que se manifestava meramente como consumidora de serviços públicos insatisfeita, como já disse aqui, mas notadamente despolitizada. O caráter suprapartidário das manifestações acabou levando à entonação de “gritos de guerra” mais genéricos e pops na multidão, como “O gigante acordou”, em referência ao povo do Brasil, como se até então estivesse dormindo “deitado em berço esplêndido”. Se a intenção era celebrar a adesão incomum de cidadãos à causa, tudo bem, porém o coro tão repetido parecia jogar no lixo toda a luta dos movimentos sociais que sempre ocorreu no Brasil, mas que, ante a alienação da população e ao desdém da mídia, se passavam por invisíveis à grande massa que ora se incorporava a protestos pela primeira vez na vida. No início desta segunda fase, a grande mídia tentou classificar a ação do movimento como baderneira. Logo depois, vendo que a coisa tinha tomado uma dimensão tão grande, os mesmos órgãos de comunicação passaram a enaltecer uma espécie de “primavera brasileira”, como se a juventude brasileira estivesse fazendo uma “festa da democracia” e, a partir de então, passou a atribuir descaradamente em suas abordagens uma outra pauta às reivindicações, distinta da pauta inicial. Nessa manipulação, o calor das imagens impactantes ajudavam a transformar a série de protestos em espetáculo irresistível em cuja participação se associava um sentido genérico e assaz vazio de luta por um Brasil melhor contra a corrupção.

3ª) Na falta ou insuficiência de uma liderança que orientasse o sentido das manifestações, a pauta inicial foi se perdendo antes mesmo da vitória obtida com a redução do preço das passagens. Uma vez que isso se deu, o monstrengo gigante conservador já havia sido despertado, comeu toda a papa que a imprensa processou para ele engolir durante anos e aproveitou essa oportunidade para vomitá-la raivosamente nas ruas.  A agenda da direita passa a predominar cooptando a grande massa despolitizada a partir de um discurso moralista que lhe é peculiar. A ignorância generalizada se exacerba em uma histeria coletiva esquizofrênica com viés fascista.

Agora, vamos assistir as próximas fases do lado de fora e tirar lições.



quarta-feira, 19 de junho de 2013

Ocupar o Estado e a cibernética

Poder é a capacidade de submeter a vontade alheia à vontade própria. Não existe sociedade sem poder e, já que não tem jeito, a democracia é encarada como um modelo mais adequado à satisfação das liberdades individuais. Em tese, as democracias republicanas atribuem ao povo a “propriedade” do poder, mas a posse, de fato, só é resgatada por ele episodicamente.

A política é uma luta pelo poder e, admitida a necessidade do Estado para a sociedade se organizar, a política acaba sendo uma luta pela participação no âmbito estatal, de onde emanam as regras que pautam toda a sociedade. Essa participação nada mais é do que uma ocupação desse espaço institucional. Hannah Arendt nos diz: o sentido da política é a liberdade. Quando você vira as costas para a política, ela será oportunamente ocupada por alguém cujos interesses podem te escravizar em um sistema de lógica perversa. A única saída é participar e, para isso, é necessário fiscalizar.
Transparência para os poderosos e privacidade para os fracos
Transparência para os poderosos e privacidade para os fracos é o grande lema dos cypherphunks, ativistas que defendem o uso da criptografia e de métodos similares para provocar mudanças sociais e políticas.

Publicado quando se completaram 778 dias da prisão de Julian Assange e após 228 anos da idealização do panóptico por Jeremy Bentham, o livro que estou lendo agora Cypherpunks: liberdade e o futuro da internet, de Julian Assange, Jacob Appelbaum, Andy Müller-Maguhn e Jéremie Zimmermann, tem por base uma conversa entre os quatro autores. Prestar atenção na mensagem deles me parece obrigatório para quem se preocupa com a tal da liberdade, vê só alguns trechos:
“Este livro não é um manifesto. Não há tempo para isso. Este livro é um alerta. O mundo não está deslizando, mas avançando a passos largos na direção de uma nova distopia transnacional. Esse fato não tem sido reconhecido de maneira adequada fora dos círculos de segurança nacional. Antes, tem sido encoberto pelo sigilo, pela complexidade e pela escala. A internet, nossa maior ferramenta de emancipação, está sendo transformada no mais perigoso facilitador do totalitarismo que já vimos. A internet é uma ameaça à civilização humana.” 

“O universo acredita na criptografia. É mais fácil criptografar informações do que descriptografá-las. Notamos que seria possível utilizar essa estranha propriedade para criar as leis de um novo mundo. (...) E, assim, declarar a independência.”

“As lições da Guerra Fria não devem ser esquecidas ou a história se repetirá”.
 
 

PEC 37: realmente sabemos do que se trata?

Por ocasião das manifestações que correm pelo Brasil, é muito infeliz que a presença do senso comum predomine porque enfraquece o sentido original das reivindicações. Nesse contexto, a mídia aproveita para empurrar à sociedade a campanha contra a aprovação da PEC 37 e seu numeroso rebanho simplesmente adere a isso sem fazer uma reflexão adequada a respeito. Então, lá vou eu desencarregar minha consciência, tentando contribuir para um contraponto que entendo necessário.
 
Primeiro, você já leu o texto da PEC 37? Ah tá, então prossigamos. A investigação criminal tem por finalidade a completa elucidação dos fatos, com a colheita de todos os elementos e indícios necessários à tutela jurisdicional adequada. O inquérito policial é o único instrumento que garante o controle de todas as partes envolvidas no processo e também do juiz, sendo um meio de investigação formal, com regras e prazo, compatível com o devido processo legal e com o Estado democrático de direito.
 
Já a investigação criminal realizada pelo Ministério Público é marcada pela falta de regras legais claras que a regule, o que leva a uma distorção para a democracia brasileira. Confira-se o meu testemunho pessoal: nunca gostei de direito penal porque acho extremamente burro enjaular um amontoado de pessoas pobres e negras sem que haja um investimento consistente na superação da causa do problema, que é social. Ainda assim, quando eu tinha uns 20, 21 anos de idade, me surgiu a oportunidade de fazer um estágio na área criminal do Ministério Público do Rio de Janeiro e resolvi aproveitá-la. Se a matéria jurídica em si não me despertava grande interesse, a experiência sócio-antropológica era valiosa. De um lado, promotores de justiça elitistas, bem à moda brasileira, seguindo a ideologia dominante de encarceramento máximo. De outro, a maldita plebe. As audiências pareciam reunião de comadre entre juízes e promotores e os réus eram muitas vezes humilhados. Mas o mais marcante que ficou para mim foi a frase do meu chefe, promotor de justiça, que me dizia: "Nós fazemos o gol, não é o juiz. O juiz sempre vai na cabeça do Ministério Público, é muito raro que discorde. Em 99,9% dos casos, o juiz segue o que o promotor defende".
 
De certo modo, é até natural que isso aconteça, pois, de maneira contrária ao que quer a nossa Constituição Federal, o MP vem realizando investigação criminal, o que envolve, com sua  autoridade, privilégios no acesso a dados e fontes que a parte ré não consegue acompanhar. Então, ora, se o MP tem esses poderes, deduz-se que pode ter ido mais a fundo na questão, permitindo que sua opinião seja a mais acertada. Assim, de maneira hipertendenciosa, o MP denuncia, investiga e ainda praticamente julga os próprios processos em que é parte! Se já é assim em relação a pequenos delitos, podemos imaginar a distorção que acontece quando o processo é impregnado de viés político. Não é à toa que a grande mídia encabeçada pela Rede Globo é contra a PEC 37. Portanto, recomenda-se desconfiança e mais reflexão. Sabe o golpe militar de 1964? Até hoje sustentam por aí que foi uma revolução porque muita gente o apoiou. Se dermos ferramentas para que se arme e se fortaleça uma ditadura do Judiciário, não adianta depois chorar pelas consequências, a democracia sai perdendo, vão nos culpar e ninguém vai se orgulhar disso. Pense bem.
 
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro.
Em seguida, levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois, prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas, como tenho meu emprego,
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
 
Bertold Brecht

terça-feira, 18 de junho de 2013

A paz que eu não quero

"A minha alma está armada e apontada para a cara do sossego
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz é medo."
 
 
A mídia, com seu habitual ofício de lavagem cerebral, insiste em reiterar o mote antiviolência em relação aos protestos dos dias de hoje. E, como papagaios, muitos reproduzem a mensagem: "violência é vandalismo", "vandalismo não é democrático" etc., etc., etc.
 
No meio disso tudo, convém indagar: por que somente a violência física, manifestada, a força bruta, por que só esse tipo de violência é considerado violência de fato, ou uma violência que não se justifica? Por acaso desconsideram a violência psicológica, simbólica e opressora que a adoção do modelo de Estado-empresa perpetra contra nós? A eloquente expressão de agora nas ruas não é reflexo dessa violência silenciosa? 
 
Para mim, a violência manifestada nesses protestos é simplesmente a mesma violência tornada visível pela reação popular, já sem o resguardo dos véus da hipocrisia. É a violência outrora entubada que agora se projeta para fora e que, em certa medida, é libertadora. Excessos não são convenientes, mas tampouco acredito que segurar muito esta pulsão seja sinal de civilização. Violência por violência, prefiro esta, escancarada com o quebra-quebra de agências bancárias e dos demais símbolos de opressão do sistema (desde que preservada a integridade física das pessoas, que sempre merecem liberdade para continuar se expressando. A dor física inibe o engajamento em prol da liberdade, ao passo que a dor íntima pode ativá-lo).
 
Como vivemos em tempos de exacerbada "cegueira" (e o pior cego é aquele que nem sabe que o é), apelar para a explicitação da violência é uma espécie de "quer que eu desenhe?", uma reação natural ou um desabafo através de gestos que, consolidados em emblemáticas imagens, se mostram capazes de evidenciar o óbvio aos cegos de plantão. Pois é óbvio que somos cotidianamente violentados por viver em um mundo que já estava todo errado muito antes de a gente nascer e por nos depararmos com alternativas tão dificultadas de acesso aos mecanismos de sua transformação. É óbvio que somos violentados por uma lógica que nos obriga a viver em um mundo profundamente injusto, cruel e desumano -- e, por favor, não me venha negar isso. O pior problema da violência, como disse Hannah Arendt, é que você se acostuma com ela. O caráter desumano do sistema capitalista é violento demais e só porque se acostumaram a viver nessa truculência silenciosa e cínica não significa que ela não exista e que não possa ser eliminada.
 
Por isso, me nego a pedir paz ao movimento. Em geral, prefiro a violência manifestada, desde que democraticamente canalizada, do que a imanifestada. Violência entubada é uma paz entre aspas, aquela que eu não quero.

Ei, reaça, vaza dessa marcha!

Não, reaça, eu não estou do seu lado. Não vem transformar esse protesto legítimo em uma ação despolitizante contra a corrupção. Não vem usar nariz de palhaço, não tem palhaço nenhum aqui. Agora que a mídia comprou a manifestação tu vem dizer que acordou?
O povo já está na rua há muito tempo, movimentos sociais estão mobilizados apanhando da polícia faz muito tempo. São eles os baderneiros, os vândalos, os que atrapalham o trânsito. Movimento pelo transporte, Movimento Feminista, Movimento Gay, Movimento pela Terra, Movimento Estudantil… Ninguém tava dormindo! Essa violência que espanta todo mundo não é novidade, não é coisa de agora. Acontece TODOS os dias nas periferias brasileiras, onde não tem câmera pra registrar ou repórter para se machucar e modificar o discurso da mídia.
Não podemos admitir que nossa luta seja convertida pela direita numa passeata contra a corrupção. Não é uma causa de neoliberais. Não é uma causa pelos valores e pela família. Não estamos pedindo o fim do Estado – pelo contrário! – Esse “Acorda, Brasil” não tem absolutamente NADA a ver com a mobilização das últimas semanas.
Então se tu realmente acredita que a mídia tá do nosso lado, abre os olhos! São muitas as maneiras de se acabar com um levante: força policial, mídia oportunista, adoção e desconstrução do discurso…
Começou a disputa pelos sentidos da efervescência:
“Não é nem um pouco fácil entender a proporção que as coisas estão tomando no Brasil. Os protestos estão cada vez mais heterogêneos, e amanhã (hoje) vai ser um dia gigante e imprevisível. Protestos são convocados por desde movimentos libertários e autogestionados (que se encontram na gênese das manifestações) até pelas páginas ufanistas/moralistas/udenistas como a antipetista Acorda Brasil, que dissemina desinformação e preconceito de classe. Se esse choque de alteridades pode ser potente, também pode gerar desmobilização numa questão de semanas. Começou a disputa pelos sentidos da efervescência. Reacionários estão determinados a também sair do facebook e transformar a insatisfação coletiva numa versão inchada do elitista Movimento Cansei, com sua pauta moralista e antipetista. Por outro lado, governistas estão mais preocupados em deslegitimar as manifestações e em blindar os governos petistas, que não se pronunciam sobre o que acontece por não conseguirem compreender o novo, e quando se pronunciam, não conseguem romper com o emcimadomurismo. A multiplicidade de pautas que desaguam nessa insatisfação generalizada torna impossível vislumbrar os rumos que as coisas irão tomar. Será árdua a tarefa de disputá-los.”
 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Pegando carona...

Ainda sobre "pegar carona" nos protestos contra o aumento das passagens de ônibus, recomenda-se cautela antes de aplaudir a horizontalidade das manifestações: há o risco de a voz da direita acabar prevalecendo na multidão. A união da esquerda é fundamental.

Setores reacionários se organizam em outro front
Por Ferrer – 16/06/13

As manifestações recentes apresentam um cenário, até certo ponto, inédito no Brasil. Se até um passado recente, o poder executivo era majoritariamente liderado pelos partidos de direita, hoje o poder está mais distribuído. O governo baiano, gaúcho e do distrito federal são petistas. O PSDB mantém os governos de Minas, São Paulo, Goiás, Paraná. Já o movediço PMDB dirige o Estado do Rio de Janeiro. Em todos esses estados tivemos manifestações. Em todos esses Estados tivemos uma dura repressão da polícia. O que fica claro é que nem os partidos de direita nem os de esquerda sabem lidar com protestos. Ainda mais quando esses protestos não são organizados e dirigidos por movimentos sociais, organizações sindicais devidamente estabelecidos e com lideranças conhecidas.
 
A nova cara das manifestações caracteriza-se justamente na ausência de uma cara. É a horizontalidade de sua organização sua principal característica. Bom ou ruim essa é a realidade. E a ausência de compromissos com o poder, com o jogo partidário ou mesmo com as próximas eleições é um desafio completamente novo para nossa elite política. E é esse o tempero que mobiliza cada vez mais manifestante e o torna ainda mais magnífico, mais libertador e mais atraente.
São muitas as vozes descontentes no país. Afinal são muitos os motivos. Essa anarquia, entretanto, também traz seus riscos. Quando todos os descontentes saem às ruas e cada um de seus ativistas leva consigo a sua própria bandeira, o movimento corre sério risco de se perder.
 
Tenho visto na Internet as mais variadas manifestações. Até quinta-feira, parte considerável da mídia, muitos dos meus amigos reacionários e outros órfãos da TFP defendiam o fim daquilo que chamaram de baderna. Bradavam pelo direito de ir e vir e defendiam maior energia e intolerância das autoridades e seus aparatos policiais. Os editoriais da Folha e do Estadão foram a senha para que o Governador autorizasse a polícia a descer o cacete nos manifestantes.
 
O problema é que hoje a Internet, mais especificamente, as redes sociais permitiram que grande parte da população tivesse acesso ao outro lado da notícia. A violência desproporcional e sem precedentes da polícia foram escancaradas. A tal depredação do patrimônio público virou motivo de chacota depois que flagrou-se policiais quebrando a própria viatura e prendendo “terroristas” que portavam vinagre. Diante dos fatos, não há argumentos e os reacionários de plantão perderam a mais importante das batalhas. A batalha da comunicação. As imagens deram legitimidade à manifestação. O movimento ampliou sua capacidade de conquistar novos corações.
 
Mas os reacionários não estão derrotados ainda. Com sua força repressora desmoralizada, eles estão se reorganizando em outro front. Partiram agora para a dispersão das bandeiras. E alerto que esse é muito mais perigoso para o movimento. Navegando pelas redes sociais tenho visto diversos vídeos, textos, cartazes conclamando para a manifestação. Dizem que não se trata de 20 centavos, não se trata se quer de um transporte coletivo gratuito. A bandeira agora é dizer que o aumento é só a última gota. Defendem que os manifestantes, na realidade, não toleram mais “bolsa isso, bolsa aquilo”, são contra os mensaleiros, contra a política fiscal do governo, contra os “tentáculos do governo nas empresas estatais”, contra os impostos, contra a inflação, etc. Trata-se de um claro objetivo de capitalizar o movimento para as bandeiras da direita reacionária desse país.
 
O libertário movimento deve deixar claro. O aumento de 20 centavos é sim a última gota. Mas nosso “copo” está cheio é de um modelo econômico que não democratiza as oportunidades, que não democratiza a terra, que não democratiza a educação, que não democratiza a sociedade. Deve deixar claro que o direito de ir e vir passa obrigatoriamente pela gratuidade do transporte coletivo e que este deve ser pago por aqueles que dele se beneficiam (ou seja, todo cidadão) e não pelos seus usuários. Somos contra a corrupção, mas não somos idiotas. A corrupção está entranhada em toda a sociedade. Não suportamos mais a corrupção policial, os “jeitinhos” para liberações de alvarás de grandes edifícios e shopping centers, não suportamos mais “um por fora” para acelerar processos na justiça, não suportamos mais concessões e privatizações que não trazem efetivo retorno para os mais pobres, não suportamos mais uma saúde e uma educação dirigida por um sistema que visa o lucro, não suportamos mais um modelo de eleições determinado pelo grande capital. O Brasil mudou e quer continuar mudando. Não queremos a volta da recessão, do desemprego, das privatizações escandalosas, da subserviência ao FMI e seu modelo de Estado Mínimo.
Queremos um estado que nos dê oportunidade de vencer, uma polícia que nos proteja e uma sociedade que nos respeite. Somos todos brasileiros e tudo que queremos é caminharmos juntos para um futuro mais justo, mais livre e mais igual.
 
O maior patrimônio de um país é o direito de seus cidadãos gritarem por um país melhor. Esse patrimônio que queremos resgatar. Essa é a nossa bandeira.
“Paz sem voz não é paz, é medo”
 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Protesto na rua em tempos de redes sociais: pegamos carona ou dirigimos?

Ontem fui ao protesto no centro do Rio de Janeiro contra o aumento das passagens do transporte público. Posso dizer: mais do que manifestação política propriamente dita, foi uma grande manifestação de insatisfação de consumidores de serviços públicos. Exatamente o contrário do que afirmou, com sua miopia característica, o governador Sérgio Cabral (ele disse: “essas manifestações estão tendo um caráter, um ar político que não é espontâneo da população"). De fato, havia militantes de partidos políticos e a questão de fundo é política, mas considero que o protesto, inserido na onda de manifestações que acontecem por todo o Brasil, é um fenômeno bastante semelhante a outros que têm ocorrido pelo mundo, sendo a Primavera Árabe o mais representativo deles.
 
A base desse fenômeno deriva de outro fenômeno, a chamada “comunicação viral”, que age como uma epidemia em um formato de comunicação que aproveita a capacidade tecnológica de multiplicar a informação rapidamente, atingindo milhares e até milhões de indivíduos. A ação viral depende do volume de transmissão entre as pessoas e se mostra capaz de alterar opiniões da noite para o dia, geralmente atingindo grupos distantes geograficamente. Isso significa que a participação popular em massa, em tempos de internet, pode ter origem em impulsos ou modismos, como manifestações pautadas na superficialidade de informação, sem refletir um entendimento ponderado a respeito do assunto em questão, haja vista que através de um simples "clique", uma mensagem rápida e de fácil acesso circula por uma rede incomensurável de pessoas. Um notório exemplo da ocorrência do fenômeno no Brasil é a mensagem transmitida reiteradamente, via e-mail e outras ferramentas virtuais, pela qual se divulga a falácia de que uma determinada quantidade de votos nulos em uma eleição seria capaz de conduzir à anulação da mesma. A enorme repercussão da mensagem na internet indica que seu conteúdo foi admitido como verdadeiro por uma também enorme quantidade de eleitores brasileiros, levando a Justiça Eleitoral a promover informes publicitários para esclarecer a população.

No protesto de ontem, vi muito desse fenômeno viral: muita gente sem um pingo de discernimento político aderiu ao chamado replicado nas redes sociais e simplesmente “pegou carona” nas manifestações contra o aumento das passagens, que realmente é insuportável, para expressar insatisfação diante de um pacote genérico de distorções que dizem respeito à frequente inversão de valores no funcionamento das cidades, que está tão escrachada quanto insustentável.

O incipiente grau de politização dos manifestantes não retira a importância do acontecimento, pois, ainda que sem orientação político-partidária, o protesto pode produzir relevantes efeitos políticos concretos, como um carro desgovernado que pode atropelar uma liderança política que não está agradando. Mais ou menos como foi deposto Mubarak, então presidente do Egito. Mas, e depois? Como reorientar a política sem uma direção político-partidária por trás do movimento? Aqui no Brasil, acho que ainda dá tempo de os partidos de esquerda se organizarem e se apresentarem adequadamente para absorver a demanda por representatividade que se coloca tão explicitamente.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

A questão da comunicação

O enfrentamento do problema da comunicação de massa é fundamental para a emancipação dos povos. Para mim, trata-se da questão mais importante a ser resolvida pelas democracias atualmente, razão pela qual considero indispensável sua abordagem aqui neste blog.
Ninguém duvida que a comunicação social foi apropriada pelos regimes totalitários do século 20, quando os meios de comunicação serviram de aparelhos ideológicos de estado. No entanto, a intensificação da associação de ideias entre liberdade, democracia e capitalismo a partir do final dos anos 1980 tem produzido uma cegueira que se estende até os círculos acadêmicos, de modo que as teorias democráticas contemporâneas não têm dedicado ou dedicam pouquíssima atenção ao papel central exercido pela mídia nas sociedades reais do século 21 – sociedades de massa, globalizadas e cindidas por classes sociais[1].
O que quero dizer é que se outrora a preocupação da tutela dos direitos individuais, como a liberdade de expressão, incidia sobre a ação estatal, impondo-lhe postura negativa (de não fazer, isto é, de não invadir a esfera privada), agora são as grandes empresas que tomaram esse lugar que era atribuído ao Estado. São elas que ameaçam a liberdade de expressão e que invadem a esfera privada. E, desse modo, acaba que todos ficam sob o controle do grande capital, inclusive o Estado, que é alimentado principalmente pela tributação oriunda das grandes corporações empresariais privadas. Se esta é a ordem inerente ao sistema capitalista, é, na verdade, exatamente diante dela que as liberdades individuais devem se afirmar, e não propriamente ou com direcionamento especialmente enfático em relação ao Estado, que, mais do que nunca, não passa de uma instância modelada e instrumentalizada pelo capital econômico.
 
Nesse novo tipo de totalitarismo, a reprodução e disseminação ideológica se operam em uma triste idiotização[2] geral da população, atuando em várias frentes: mídia impressa, rádio, televisão etc. Trata-se de um reino onde campeia impune o culto à personalidade dos medíocres, da publicidade degenerada indutora de comportamentos servis, da conspiração sistemática contra a memória, a dignidade, a cultura, a ciência e, sobretudo, contra a liberdade para o desenvolvimento humano baseado no pensamento livre de manipulações e conduções sistemáticas de ideias em um mesmo sentido ideológico.
 

A imprensa brasileira mente, é claro, mas manipula ainda que não minta. As teorias do gatekeeper e da parede e da lanterna tratam da manipulação, mesmo que apenas se fale a verdade. Na teoria do gatekeeper, a mídia funciona como um porteiro que diz: “esta verdade deixa passar, esta também, esta não, é perigosa, fica quietinha aí”. Já a teoria da parede e da lanterna funciona da seguinte maneira: imagine que toda a verdade do universo é ou está num grande muro à sua frente, mas ele está no escuro[3].


Você não é capaz de descrever como é todo o muro, apenas a parte que lhe mostram.

O escuro representa a ignorância total, ninguém sequer vê o muro, você pode caminhar até rebentar o nariz nele e não saberá o que te atingiu. Então a mídia é iluminadora, a mídia é uma lanterna que esclarece com sua luz. O problema é que toda lanterna tem um foco, que é a área onde a luz vai atingir. Não se pode iluminar todo o muro, apenas uma parte. E a malandragem está em decidir qual parte do muro quer ser mostrada. No caso do gatekeeper, qual verdade o porteiro vai deixar entrar.

Portanto, não é preciso haver mentira para haver um mito. De fato, a maioria dos mitos não são feitos na base da mentira e sim da omissão dos fatos e da pauta que a grande mídia dá pra este ou aquele assunto. A televisão? Ah, esta, então, com certeza te conduz feito um boi para lá e para cá (leia Sobre a Televisão, de Pierre Bourdieu).
Como não ser massa de manobra, como não ser mais um seduzido e cooptado pelo discurso midiático? Sendo crítico, isto é, formando um pensamento crítico. A crítica é a nossa arma e o dinheiro não a compra: o esforço pessoal é imprescindível, cada um precisa correr atrás de sua própria lucidez, uma lucidez que ninguém, além de você mesmo, pode lhe usurpar. Este blog não deixa de tentar contribuir para isso, pois acredito que quanto mais inspirações à construção do pensamento crítico pudermos espalhar pela internet, mais chances temos de promovê-lo para desencantar o mundo do sonambulismo que o tem movido.

 




[1] Vide Luis Felipe Miguel, Um Ponto Cego nas Teorias da Democracia: Os Meios de Comunicação.
[2] Cunhado na Grécia antiga, o sentido original da palavra “idiota” é aquele que não gosta de política.

Massas ovelhas...



"Protesto é quando eu digo que algo me incomoda. Resistência é quando eu me asseguro que aquilo que me incomoda nunca mais acontecerá (...) Os estudantes não estão se revoltando, eles estão exercendo resistência. Pedras voaram, os vidros das janelas foram quebrados (...) a fronteira entre o protesto verbal e a resistência física foi cruzada, pela primeira vez em grande escala: por muitos, e não apenas indivíduos isolados, por dias, e não apenas uma vez, em todo lugar , e não apenas na capital, de verdade, não apenas simbolicamente (...) Seria tudo apenas uma escalada terrorista apolítica, violenta, impotente, sem sentido? Que seja dito: aqueles aqui que, a partir de posições de poder político, condenam quem atira pedras e colocam fogo, mas não condenam a manipulação da imprensa fascista, nem as bombas caindo no Vietnã, nem o terror na Pérsia, e não falam da tortura na África do Sul, em vez disso espalham meias-verdades sobre os estudantes, a sua participação em nome da não-violência é hipócrita, eles têm um duplo padrão, eles querem precisamente o que os que foram às ruas - com e sem pedras em nossos bolsos - não querem: a política como destino, massas ovelhas, como uma oposição impotente que não perturba nada nem ninguém (...) e quando as coisas ficam sérias, o [a proclamação de um] estado de emergência.(...) Eles estão perdendo tanto a política quanto a justificação moral para reclamar do desejo de resistir dos estudantes".

Poderia ser dos dias de hoje, mas é de Maio de 1968.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Protestar no Facebook não adianta. Tem que fechar avenida

Por Lino Bocchini — Carta Capital, publicado 07/06/2013 16:27, última modificação 08/06/2013 09:02 (ADAPTADO).

 
Para algo acontecer tem que incomodar. E isso é, sim, coisa de gente civilizada. O dinheiro pressiona de um lado, as ruas têm que pressionar de outro.
 
            
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Boa parte da mídia e a maioria das manifestações na internet deslegitimam protestos por conta de danos derivados. Para eles, seria um vandalismo injustificável. Para outros tantos, é igualmente inaceitável que o trânsito seja fechado, pela manifestação que for. Não concordo com nenhum dos dois argumentos.
Primeiro, esses mesmos que condenam os jovens que foram às ruas vivem bradando que a população não pode assistir impune à corrupção e demais problemas dos governos. A turma que grita “Acorda Brasil!” e outras palavras de ordem na rede vive pedindo reação popular. “Ah, mas tem formas mais civilizadas de se fazer isso, pela internet, escrevendo aos políticos, fazendo abaixo-assinados etc”.
Ã-hã. O que te parece mais eficiente? Lotar a caixa de e-mail de um assessor de quinto escalão ou fechar uma avenida num horário de pico? E desde quando grupo ou evento de Facebook muda alguma coisa? Aliás, o tal abaixo-assinado com sei lá quantas mil assinaturas contra o Renan Calheiros na presidência do Senado deu no quê mesmo? Redes sociais como o Facebook são excelentes para a troca de informação, para conectar pessoas que pensam de forma semelhante, para ajudar na organização. Mas, se a grita não sair da internet e for pra rua, de nada adianta. Nadinha.
 
Paris em chamas, sinal de civilidade
 
Paris teve protestos violentíssimos em suas periferias em 2005. Após a morte de dois africanos pela polícia no subúrbio de Seine-Saint-Denis, seguiram-se 19 dias e noites de protestos e depredação. Quase 9 mil carros foram queimados e os prejuízos, segundo estimativas conservadoras, foram de 200 milhões de dólares. Alguém acha que a Paris ficou um lugar mais inseguro, selvagem ou menos civilizado após isso? Tornou-se um destino menos atraente para as próximas férias?
E é bem melhor que seja assim, com protesto. E protesto, via de regra, não tem regra. E convenhamos: mesmo com vidros quebrados, lixeiras viradas e centenas de homens da Tropa de Choque na rua, nesta quinta-feira em São Paulo, ninguém saiu gravemente ferido -- neste artigo nem vou entrar na questão da atuação da polícia, tema que por si só merecia outro artigo.
Na Europa ou mesmo em vizinhos como Argentina e Chile, países em que a população, na média, estudou por mais tempo, lê mais livros e vai mais ao teatro ao cinema do que no Brasil, as pessoas reclamam mais e vão mais às ruas. E, sim, em muitos casos há depredação.
E que sorte a deles que seja assim. O dinheiro pressiona do lado, as ruas têm que pressionar de outro. Por conta de tais protestos, seguramente governantes vão se esforçar mais para evitar um novo problema, ou o agravamento do mesmo. Imagine se fosse apenas o mercado sozinho que regulasse tudo, que decidisse quando e quanto os preços aumentam, sem pressão social contundente alguma? Aí sim seria o caos.
Por fim, o trânsito, o sagrado trânsito nosso de cada dia... o motorista paulistano (e o carioca, o goiano, o pernambucano, o manauara) não aceita que você encoste no carro deles. Buzinam como loucos meio segundo depois do farol abrir, com pressa pra tirar não apenas a mãe, mas também o pai, o avô e o cachorro da forca. Sinto muito. Na verdade, sendo sincero, não sinto nada, vamos lá: protestar e fechar o trânsito é, sim, legítimo. Até  alguns sacos de lixo queimados está, de certa forma, dentro das regras do jogo. Passa anos-luz de ser o crime hediondo no tribunal tosco das redes sociais.
Chega a ser cômico reclamar que o trânsito não anda por causa de um protesto. E nos demais dias do ano? Aí anda? E como resolver isso? Xingando no Facebook os moleques que protestam ou se aliando a eles, indo às ruas protestar, entre outras coisas, por um transporte público melhor e mais barato? Fico com a segunda opção.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Chega de blábláblá e viva o realismo: política é sobre interesses e poder

Carregando 21 séculos nas costas, marcados pelo advento da mensagem de Jesus, que desencadeou toda sorte de manifestações de esperança na humanidade, cá permanecemos neste mar de insanidades. Melhoras muito lentamente aconteceram, sim, mas paralelas a outras tantas pioras. Para quem se sente absolutamente satisfeito em uma vida confortável, prazerosa e bem-sucedida, parabéns: você é um individualista alienado, omisso, que não olha ao redor e muito menos se coloca no lugar do outro para praticar seu catecismo. Se há uma contrapartida a essa sua “felicidade”, não posso responder com quase nenhum argumento que não caia em meus esoterismos, exceto por alguns resultados científicos esparsos, como a comprovação de que a prática da solidariedade evita várias doenças. No mais, enquanto se alimenta a crença de que a ciência deve servir ao nosso “progresso” (e sabe-se bem o que isto quer dizer), seria muita pretensão minha querer apresentar dados científicos sobre questões mais existenciais.
 
Não é novidade que crenças fabricadas pela ideologia fazem a cabeça do senso comum e que isso é desejável pelos donos do poder político. Em não sendo novidade, por que tanta gente, inclusive com diploma universitário e título de doutor no currículo, não procura formar um próprio pensamento crítico real? Aparecem “N” inconsoláveis respostas. Ocorre que é extremamente cansativo e nauseante ver e ser cúmplice de gente falando tanta babaquice como ventríloquo de quem está no poder ou, pior, gente egoísta que prefere se alhear. Dói admitir, mas a verdade é que todo mundo é racional o suficiente para escolher entre pelo menos desejar estar dentro ou fora da caixinha, e, sempre havendo esse livre arbítrio, conclui-se: a maioria não é essencialmente tapada, a maioria simplesmente escolhe ser babaca, não se interessando realmente em buscar um mundo melhor.
 
Então, o que nós, os inconformados, que não compactuamos com essa hipocrisia toda, podemos fazer?
 
Acho que a contribuição do pensamento político para a conquista de uma prática política emancipatória pode começar por aqui: chega de apostar na deliberação! Sejamos realistas o bastante para encarar que o funcionamento da política, como já nos dizia Maquiavel, envolve embates por poder, o que não implica que os agentes políticos sejam necessariamente “maus”, segundo a moralidade convencional, ou insensíveis às preocupações e ao bem-estar de outros. Indica, apenas, que o poder é o recurso necessário para a realização de qualquer objetivo político, até mesmo para a efetivação de alguma determinada concepção de justiça.

É preciso esquecer a percepção ilusória da política segundo a qual a multiplicidade de vozes em deliberação geraria uma visão mais completa da realidade e, assim, uma decisão cognitivamente superior. O conflito político, mais do que desejável e tolerável, é NECESSÁRIO em uma democracia. Enquanto houver gente que precise ser cobrada ou controlada pelos auspícios de normas jurídicas, não há equilíbrio espontâneo possível. O conflito é a realidade, e a busca de uma democracia isenta do conflito político nega seu próprio caráter democrático.

Como no verso da canção Bom conselho, de Chico Buarque, quem espera nunca alcança. Chega de paciência, chega de blábláblá, chega de acreditar no mito de que podemos resolver nossos problemas entubando conflitos latentes.

O viés da disponibilidade

Sobre formação de opinião pública, efeito manada e o tal sonambulismo que move o mundo, considero importantíssimo entender um pouco sobre isto: em meados dos anos 70, uma pesquisa identificou que, quando tomamos decisões, muitas vezes usamos heurísticas (numa definição simples, atalhos mentais). O problema é que as heurísticas são traiçoeiras. Úteis em muitos casos, tais atalhos, em certas circunstâncias, nos levam a erros (no jargão da área, elas produzem vieses cognitivos). Kahneman e Tversky, em estudo seminal, identificaram três heurísticas e seus respectivos vieses: a heurística da disponibilidade, a heurística da representatividade e o efeito de ancoragem. A heurística da representatividade faz com que nos desviemos da estatística em prol de associações de ideias fundadas em estereótipos. O efeito de ancoragem sugere que o ser humano tende a escolher respostas que sejam próximas a valores ou informações sugeridos pela pergunta – ainda quando tais valores não tenham absolutamente nada a ver com a resposta. Finalmente, a que queremos destacar aqui: a HEURÍSTICA DA DISPONIBILIDADE: associada à saliência de certos eventos na memória coletiva, tal heurística afirma que as pessoas concluem a respeito da probabilidade de determinado evento com base na facilidade com que ocorrências dele podem ser lembradas. É por isso que, em geral, preocupa-se mais com furacões logo após ter-se passado por um; e é por isso que riscos mais recentes ou mais espetaculares são mais combatidos do que riscos mais triviais ou mais distantes no tempo.
Estudos clássicos explicam a estrutura cognitiva que gera tais desvios usando um modelo bipolar. É como se existissem 2 sistemas de pensamento dentro de nós: um responsável pela intuição e por processos mentais automáticos; outro, responsável por processos conscientes, racionais, deliberados. Cabe ao sistema automático a maioria das tarefas cotidianas. Sua domesticação, pelo sistema consciente, leva tempo e requer esforço. As interações entre os dois sistemas é que geram os vieses. A conclusão dessas pesquisas sugere modéstia quando às nossas capacidades como agentes racionais.

Aí é que entra o conceito de nudge, prática que levaria o poder público a arquitetar escolhas quando as pessoas estão diante de situações nas quais há alta probabilidade de que façam escolhas ruins. Diante desse pano de fundo de escolhas equivocadas, agentes enviesados e inevitabilidade, os autores Thaler e Sustein propõem o uso do nudge como paternalismo libertário. Há nela algo de paternalista, pois a arquitetura de escolhas visa, sim, induzir comportamentos. Mas também seria libertária, pois a possibilidade de escolhas estaria sempre presente. Não seria um paternalismo puro. O nudge como instrumento de política pública ainda é relativa novidade no Brasil.
 
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Baseado no artigo "Heurísticas: Yes, a opinião pública também é irracional!", de José Vicente Santos de Mendonça na Revista Insight Inteligência, nº 60.